domingo, 13 de junho de 2010
DA I REPÚBLICA AO 28 DE MAIO:
POLÍTICA, ECONOMIA E SOCIEDADE – III
(Continuação)
Jorge Gonçalves Guimarães
4. SociedadeNa sociedade desta época, ao lado de um estrato da burguesia rica, associada à propriedade fundiária e ao capital financeiro, descobre-se também uma classe média das cidades (Lisboa e Porto), ligada ao comércio, à indústria, às profissões liberais e ao funcionalismo público. Integrava ainda este grupo a maior parte dos oficiais não superiores do exército e da marinha, bem como um conjunto de pequenos e médios proprietários rurais. As suas ambições eram, naturalmente, ascender a um cargo na governação política e económica do país, tendo sido ele, juntamente com o proletariado rural e urbano(1), o grande autor da República. Contudo, instaurada a República, foi sobretudo a alta classe média que ocupou a maioria dos cargos e tratou de defender os seus interesses, situação que esclarece o fosso que se viria a cavar relativamente às classes populares bem como a acesa oposição da burguesia rica.
As cidades de Lisboa e Porto contavam com um núcleo de operários fabris(2) que, por ser reduzido, não tinha grande consciência de classe, muito embora tenha, desde o último quartel do século XIX, por recurso ao movimento grevista, manifestado as suas reivindicações essencialmente por questões salariais ou de horário de trabalho, se bem que possam ainda ser inventariados outros motivos não tão estreitamente relacionados com questões laborais. Assim, o decreto de 6 de Janeiro de 1910, que legalizou o direito de greve e de lock-out, mais não foi do que a transformação em situação de direito de uma outra de facto que já vinha do tempo da monarquia(3). Contudo, ao colocar patrões e operários em pé de igualdade, esta medida contribuiu para radicalizar a sociedade, isto não contando com os prejuízos causados pela possibilidade de a produção poder ser paralisada tanto por uns como por outros.
Se antes de 1910 os republicanos conseguiram, pela promessa de resolução de inúmeros problemas, a adesão deste grupo, cedo se verificou um divórcio entre o operariado e a classe burguesa republicana que via no movimento grevista(4) uma investida contra a ordem estabelecida. Esta situação, aliada ao facto de alguns dirigentes sindicais reclamarem para o operariado uma parte da autoria da revolução, conduziu a que este grupo acabasse por se opor ao regime e, frequentes vezes, se associasse a elementos monárquicos e da extrema direita(5).
Foi em parte esta crescente contestação operária, aliada também à incapacidade dos sucessivos governos para encontrarem soluções adequadas, que poderá esclarecer a circunstância de a burguesia industrial, comercial, e agrícola, ultrapassando o plano partidário, se ter organizado, formando associações patronais de que o caso mais paradigmático é, em 1924, a União dos Interesses Económicos.
Nos meios rurais encontramos para além dos pequenos proprietários, e deles pouco se distinguindo, um vasto grupo de camponeses de condição quase servil, e facilmente manipuláveis pelos senhores da terra, pelos caciques e pelo clero rural. Fundamentalmente rendeiros e assalariados, a sua principal preocupação prendia-se com questões de subsistência, se bem que, devido ao aumento dos salários rurais decorrente da emigração, a sua situação tenha conhecido alguma melhoria no primeiro quartel do século XX.
5. O Exército
A evolução da instituição militar durante este período constitui outro elemento importante para a compreensão do 28 de Maio. O primeiro dado relevante prende-se com o facto de a instauração do regime republicano não se ter feito acompanhar de uma renovação significativa dos elementos do exército. A maior parte dos oficiais superiores que serviam no tempo da Monarquia continuaram a servir durante a República.
Com a participação de Portugal na guerra, o exército conheceu não só um considerável aumento de efectivos como também um acréscimo de oficiais que o alimentou com uma importante fatia da pequena e média burguesia. Se no seio dos oficiais superiores predominava o Tradicionalismo, as ideias de direita e do Integralismo Lusitano convocavam muito do oficialato mais jovem.
Por outro lado, além de a conjuntura europeia exibir a formação de governos fortes com origem na intervenção do exército, o crescente papel do exército na manutenção da ordem pública - sobretudo depois da significativa redução dos efectivos da GNR, em 1922 - conferiu aos militares um novo prestígio e legitimidade de intervenção na condução dos acontecimentos políticos, sendo este aspecto bem visível no número de militares que compuseram os ministérios entre o fim da guerra e 1926. Recorde-se ainda que se o golpe dos oficiais conservadores da guarnição de Lisboa de 18 de Abril de 1925 foi o 1º ensaio do 28 de Maio, não é menos certo que a absolvição dos revoltosos da tentativa revolucionária de 19 de Julho do mesmo ano, acrescida da promoção de Mendes Cabeçadas, teve o duplo efeito de desacreditar o regime, por um lado, e, por outro, legitimar a intervenção do exército.
Os acontecimentos de Maio inserem-se, para além de todos os aspectos já apontados, no contexto de uma luta levada a cabo, quer pela esquerda quer pela direita, contra o domínio do Partido Democrático. Tornam-se pois compreensíveis num contexto em que as diversas forças sociais, políticas e intelectuais encaram o exército como um «meio para quebrar a hegemonia do Partido Democrático e permitir novos ordenamentos a nível do poder.»(6). Veja-se a este respeito o apelo à intervenção do exército que, sem receio de fazer perigar o quadro democrático, é feito no jornal A Capital de 27 de Maio de 1926: «A Força Armada foi sempre uma garantia de pureza dos princípios constitucionais. [...] Poderá cometer um excesso de defesa, pretendendo implantar figurinos políticos à semelhança de Itália ou da Espanha, como dizem os que estão presos ao governo pelo cordão umbilical? Não o cremos»(7).
NOTAS:
(1) As promessas de solução dos problemas do operariado urbano e do campesinato permitiram obter um forte apoio popular ao Partido Republicano, facto que permitiu que o 5 de Outubro contasse com a participação desse sector populacional. A este respeito, Miriam Halpern Pereira [Das Revoluções Liberais ao Estado Novo, Lisboa, Editorial Civilização, 1994, p. 208] refere que o partido Republicano foi o primeiro partido burguês que convocou largamente as camadas populares, isto é, um partido de «massas».
(2) Uma parte destes operários agrupava-se, desde 1914, na União Operária Nacional que, a partir de 1919, se transformou na Confederação Geral do Trabalho, seguindo de uma maneira geral uma orientação anarco-sindicalista.
(3) Recorde-se a este respeito que apesar do artº 277 do Código Penal de 1852 punir a greve com pena de prisão e multa, ele foi pouco aplicado.
(4) O número de greves aumentava à medida que cresciam os quantitativos do operariado industrial. Se em 1917 este número rondava os 142600, em 1924 passaria para 217900, maioritariamente distribuídos por Lisboa e Porto. O facto de associarem os seus interesses aos do assalariado urbano, conferia-lhe uma capacidade de pressão considerável.
(5) A. H. de Oliveira Marques, História de Portugal, Vol. III, Lisboa, Palas Editores, 1986, p. 326.
(6) Fernando Pereira Marques, «Do Exército Providencial ao Exército Salazarista», in O Fascismo em Portugal. Actas do Colóquio realizado na Faculdade de Letras de Lisboa em Março de 1980, Lisboa, A Regra do Jogo, 1982, p. 201.
(7) Apud Arnaldo Madureira, O 28 de Maio. Elementos para a sua Compreensão, Vol. I: Na Génese do Estado Novo, Lisboa, Editorial Presença, 1978, pp. 78-79.
sexta-feira, 11 de junho de 2010
terça-feira, 8 de junho de 2010
sábado, 5 de junho de 2010
quinta-feira, 3 de junho de 2010
Arthur Carlos de Barros Basto
Arthur Carlos de Barros Basto foi um capitão do exército português , convertido ao judaísmo, que na cidade do Porto, esteve entre os que hastearam a bandeira da República no 5 de Outubro de 1910.
Mais tarde, despojado do seu cargo é perseguido pelos seus ideais democráticos e republicanos e pelas suas crenças religiosas. Está a correr uma petição para que este capitão seja reabilitado pela república portuguesa. Era um gesto bonito no centenário na sua implantação, não?
Se concordar pode ir a http://comunidade-israelita-porto.org/ e assinar a petição.
Maria de Fátima Gomes
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